Espiritualidade

Desconexão

Por 12 de abril de 2011 Sem comentários

Na Bíblia a desconexão humana começou no Edem, após a desobediência . Por causa dos sentimentos de medo e vergonha, decorrentes por terem falhado, homem e mulher fazem uma cobertura para seus corpos, se escondem de Deus e quando se apresentam não assumem a responsabilidade pelos próprios atos. Todos concordam que a partir daquele momento, houve uma cisão entre o ser humano e Deus; entre o ser humano e o próximo e entre a pessoa e ela mesma. E desta forma já não sabemos identificar e ainda negamos o que sentimos. As vezes temos medo de pensar e em muitas situações nos tornamos escravos de nós mesmos. Falamos apenas meias verdades que por ser apenas metade da realidade se transformam em mentiras. E como nem sabemos mais quem somos acusamos os outros, e a Deus pela bagunça que muitas vezes fazemos com as nossas vidas. A psicologia vê as cisões como uma forma de proteção e defesa, de si mesmo, diante do desconforto e da dor. Na criança, estas desconexões são necessárias a sobrevivência. Mas na vida adulta é possível adquirir recursos para buscarmos tudo aquilo que estrangulamos em nós mesmos.

O interessante é que se ouve muitos sermões sobre a desconexão da pessoa para com Deus; alguns sobre a cisão entre uma pessoa e os outros, mas raramente se ouve alguma menção sobre a cisão de si mesmo.

É importante encararmos esta realidade, porque vivemos de acordo com estas divisões empobrecendo absurdamente a própria vida.

Esta desconexão separa o pensar do sentir, como se houvesse um corte no pescoço separando o corpo da cabeça. E uma vez separada, em si mesma, a pessoa passa a viver a vida apenas pela metade. Além disto, o comportamento resultante destas divisões ou revelam pessoas que passam por cima de si mesmas e dos outros, ou pessoas que agem apenas de acordo com os seus desejos e sentimentos sem se importarem muito com as conseqüências. E assim causam muitos danos aos outros e a si mesmos. O trágico disto é que tanto os primeiros como os segundos machucam e ferem desnecessariamente aqueles que estão a sua volta e que lhes são queridos. Os racionais ferem porque defendem as verdades que crê como indissolúveis e absolutas. E todos que estão sob sua influência terão que aceitar o que foi determinado. Neste tipo de relacionamento não há escuta amorosa e nem acolhimento. Não há espaço para que o outro se pronuncie e revele suas dificuldades. Só existe a opção de atender o que foi determinado, mesmo que o prescrito venha trazer prejuízos para quem obedece.

Os emocionais não param para pensar e avaliar o preço e as possíveis conseqüências que terão que enfrentar como resultado de ter seus anseios e vontades satisfeitas. Assim machucam porque agem considerando apenas o que pode ser bom para si mesmo e naquele momento. Ferem porque sentiram que deveriam fazer determinada coisa e fazem. Não se importam com o prejuízo causado a outros envolvidos. São pessoas que não conseguem conviver com o desconforto de ver que muitas coisas não saíram como ela queria. Ou não conseguem viver com a angústia da falta. Assim tiram o que não deveriam tirar ou deixam de dar o que é de direito de outros.

A boa notícia é que é possível fazer a integração destas partes separadas. Salomão, em Provérbios 16.32, declara que é mais importante dominar a si mesmo do que conquistar uma cidade. E Cristo, no evangelho de Lucas 9.25, nos alerta que não adianta ganhar o mundo inteiro e perder a si mesmo. O caminho da integração entre pensar e sentir, pode ser dolorido, cheio de vergonha, choro e sensação de menos valia. Em muitas situações se traduz entre o ocorrido no passado e o que se vive no presente. Nestes casos se faz necessário a reconciliação entre o agora e o que já passou. Afinal o passado mora em nós. Na fé cristã temos como referencial a vida de Cristo e o seu exemplo. O seu exemplo porque em sua genealogia estão presentes as histórias de pessoas que fizeram parte do seu passado e tiveram comportamentos não tão honrosos. E em sua vida porque há o seu sacrifício vicário, que nos acolhe em toda e qualquer vergonha, dor e desconforto.

Então da mesma forma que Cristo é o meio para a reconciliação com Deus, Ele é também o meio que dá suporte e possibilidade para a reconciliação consigo mesmo.

Se quisermos um viver abundante e com intensidade precisamos conectar tudo aquilo que em nós por alguma razão foi um dia desconectado.

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